O texto abaixo foi publicado originalmente no blog E por falar em pastoral, do amigo Rogério de Oliveira. Faz uma excelente reflexão sobre a prioridade da Igreja pelos pobres.
Falávamos
em outro artigo sobre a opção preferencial da Igreja pela
juventude. Ao olharmos nos documentos da Igreja, no entanto, é anterior a ela a
opção pelos pobres. Em tempos de teologia da prosperidade, consumismo, crises
econômicas aqui e ali, falar novamente dos pobres parece meio fora da ordem.
Para
a Pastoral da Juventude, a opção pelos pobres nunca esteve fora da pauta. Por
ser opção da Igreja, ela deve se pautar em ações. E toda ação evangelizadora
concreta se dá por meio das pastorais. No entanto, os pobres e as causas da
pobreza estavam ficando mais matizados nos discursos eclesiais.
Eles
nunca estiveram fora da prática de Jesus, fosse estando ao lado deles para
mostrar-lhes sua própria dignidade e valor, fosse estando ao lado dos ricos
para que estes se convertessem a causa da justiça, como no caso de Zaqueu.
Exatamente
por isto que para a prática cristã, o contrário de pobreza não é riqueza, mas
justiça. A miserabilidade nasce das relações injustas que a sociedade cria e ao
fazer opção pelos pobres, a Igreja quer desvelar esta realidade.
Em
16 de março de 2013, o Papa Francisco teve uma audiência com os representantes
da imprensa do mundo todo que cobriram desde a renúncia de Bento XVI até os
resultados do conclave e primeiros dias do novo pontificado. No discurso
proferido (que pode ser lido aqui), o Papa fez a afirmação que dá título a este
texto “Ah, como eu queria uma Igreja pobre e para os pobres”.
Li e
reli muitas afirmações e interpretações deste discurso e desta frase em
particular. Há quem pense que a Igreja iria desfazer-se de todos os bens que
possui para distribuí-los todos aos pobres. Há quem julgue que isto é o que
deveria ser feito. Outros acham que uma “Igreja pobre” não teria recursos para
ajudar quem precisa de ajuda.
São
afirmações colhidas fora do contexto e daquilo que é prática histórica das
comunidades cristãs, em especial aqui no continente latino-americano. Quem acha
que só “rico” pode ajudar o “pobre”, tem em sua mente que este último é objeto
da caridade do primeiro. Não sou estúpido ao ponto de afirmar que a caridade
destes pequenos atos não seja importante. Claro que é. Ela suprime uma
necessidade urgente (fome, sede, frio, doença), mas maior caridade é atacar as
causas destas necessidades.
Uma
Igreja pobre para os pobres não é formada somente por pessoas desprovidas de
bens materiais. Afirmar isto equivaleria a dizer que só um negro poderia se
engajar na causa dos negros, só mulheres na luta das mulheres, só imigrantes
valeriam na busca do direito dos imigrantes. Óbvio que a dor social é mais
sentida por aqueles que sofrem na pele e na história seus efeitos. Mas não são
portas fechadas para aqueles que querem se solidarizar e estar ao lado na busca
por justiça.
Neste
sentido que entra a opção pelos pobres abraçada pela PJ e por toda a Igreja.
Não são pobres genéricos, espalhados aqui ou ali. É todo um grupo de pessoas de
uma realidade concreta de exclusão. “É o grito de um povo que sofre e que
reclama justiça, liberdade e respeito aos direitos fundamentais dos homens e
dos povos”, como lembra o documento de Puebla.
Não
se trata de pobres numa fria realidade estatística. São pessoas com rostos bem
definidos: crianças subnutridas, jovens sem perspectivas, indígenas, camponeses
sem terra, operários, desempregados, subempregados, idosos, ribeirinhos,
dependentes de drogas, portadores de deficiências, entre tantos outros.
São
estas pessoas aquelas que o Papa Francisco aponta na sua frase-desejo que
intitula este texto. Através destas pessoas pode-se fazer a experiência do
Reino de Deus. E, como diz o Pe. João Batista Libânio, este Reino exige de nós
“esperança, práticas de caridade libertadoras, decisões urgentes e inadiáveis”.
Ao mesmo tempo em que o pobre é amado de Deus e destinatário prioritário do Seu
Reino, ele é também fruto da injustiça, do pecado social e da falta de
fraternidade. É a experiência do Reinado de Deus. É o já e o ainda não. É o
“Já”, na presença do Deus da Vida que caminha ao lado dos que sofrem e o “Ainda
não”, porque eles também são sinal da ausência da fraternidade e da justiça.
Uma
Igreja pobre para os pobres é presente pelo exemplo de Jesus que se fez pobre
entre os pobres. Ou como nos ensina São Paulo que pede que tenhamos “os
mesmos sentimentos que havia em Jesus Cristo: Ele tinha a condição divina, mas
não se apegou a sua igualdade com Deus. Pelo contrário, esvaziou-se a si mesmo,
assumindo a condição de servo e tornando-se semelhante aos homens” (Fl
2,5-7). Que nossa ação pastoral seja de serviço, serviço pleno e em favor de
quem mais precisa.